domingo, 31 de agosto de 2014

As garças.


 
AS GARÇAS

Morre a tarde de rosas na planura,
No Pantanal desce a tristeza agora,
Brancas, tão brancas como a neve pura,
Ao pouso as garças voltam, céu em fora.

Quando refulgem os cristais da aurora,
Na beleza sem par da iluminura,
O bando, que nas frondes se alcandora,
Parte em revoada, sobre vasa impura.

Aves heráclitas das verdes naves,
Dos silêncios profundos e suaves,
No sonho azul das íbis enlevadas...

Lírios alados das regiões serenas,
Trazeis na alvura imácula das penas
A pureza das virgens impecadas!

Rosário Congro 
Rosário Congro [São Paulo, SP (10-09-1884) – Três Lagoas, MS (11-10-1963)]. Advogado Provisionado; destacado Político no, então uno, Estado de Mato Grosso, tendo sido eleito Vereador em Corumbá, Deputado Estadual e depois Prefeito de Três Lagoas; virtuoso Escritor, tanto na Prosa quanto no Verso, ocupou a Cadeira de número 40 da Academia Mato-grossense de Letras, tendo como patrono o Pe. Armindo Maria de Oliveira; Historiador, Membro Efetivo do... Leia mais aqui:


sexta-feira, 29 de agosto de 2014

A aranha.

 
A ARANHA

Operária do invento,
a aranha constrói
sua casa ao relento:

Uma casa de rendas,
só de janelas,
vazia por fora,
vazia por dentro,
onde ela só -
aranha -
lavra seu tento.

Fio a fio, a prumo, tece
com argamassa de vento
e andaimes de pó.

Tece e inventa,
inventa e tece
no fio a prumo,
no prumo da casa
de janelas só.

No frio compasso
de quem descobre a vida
e enreda a morte.

Geraldo Pinto Rodrigues

 


Geraldo Pinto Rodrigues, escritor e jornalista, nasceu em Jardinópolis, Estado de São Paulo, a 7 de fevereiro de 1927, filho de João Baptista de Lima Rodrigues e de Julieta Pinto de Lima Rodrigues. Realizou os estudos primários em Rancharia e os secundários nesta capital, cursando o Colégio “Oswaldo Cruz” e o Colégio Paulistano. Ingressou depois na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, onde frequentou, durante dois anos, o Curso de Filosofia. Em 1955 bacharelou-se em... Leia mais aqui:


quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O palhaço.

 

O PALHAÇO

Ontem, viu-se-lhe em casa a esposa morta
E a filhinha mais nova, tão doente!
Hoje, o empresário vai bater-lhe à porta,
Que a plateia o reclama, impaciente.

Ao palco, em breve surge... pouco importa
o seu pesar àquela estranha gente...
E ao som das ovações que os ares corta,
trejeita, canta e ri, nervosamente.

Aos aplausos da turba, ele trabalha
para esconder o manto em que se embuça
a cruciante angústia que o retalha.

No entanto, a dor cruel mais se lhe aguça
e enquanto o lábio trêmulo gargalha,
dentro do peito o coração soluça.

Padre Antônio Tomaz 

Nasceu na cidade de Acaraú, Ceará, a 14 de setembro de 1868. Filho do professor Gil Thomaz Lourenço e dona Francisca Laurinda da Frota. Cursou latim e francês em Sobral, e concluiu seus estudos no Seminário de Fortaleza, onde foi ordenado sacerdote, em 1891. Esteve longos anos a serviço da igreja, em paróquias do interior cearense, notadamente como vigário de sua terra natal, levando vida modesta e apagada, dedicado a sua missão, escrevendo versos e cuidando de sua... Leia mais aqui: 

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

O louco.

 
O LOUCO
 
Inventou que era deus e fez das suas:
Óleos n'água pingou, criou aquarelas
Partiu uma maçã em duas luas
e cortou carambolas fez estrelas.

Quis ser o diabo e riu nos desatinos:
e riu caretas diante de dois cegos
Falou na história antiga a dois meninos
E da vida moderna a poetas gregos.

Chorou e o diabo o fez cortar cebolas
e lhe enxugou as lágrimas com lãs
de vidro e gritou puuum! Com as suas artes.

Deus bondoso o acalmou com carambolas
que comeu e então fez duas manhãs
partindo uma laranja em duas partes.

Geraldino Brasil
 


Geraldino Brasil nasceu no Engenho Boa Alegria, município de Atalaia, em Alagoas, no dia 27 de fevereiro de 1926 e faleceu no Recife em 1996, cidade que escolheu para morar na juventude, em 7 de janeiro de 1996. A paixão por escrever começou logo cedo. “Posso dizer que devo ter começado a ser poeta em alguma data antes de conhecer a poesia dos livros. Porque nasci no campo. Foi lá que as coisas que se davam gratuitamente começaram a construir a minha poesia... Leia mais aqui:


sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Eu gostaria tento.

 
EU GOSTARIA TANTO

Ah! Como eu gostaria tanto,
Que um dia, pudesses entender.
Que és o motivo, a causa do meu pranto,
Que és o fomento, a razão do meu viver.

Ah! Como eu gostaria tanto,
Que ao olhar para o céu, ao anoitecer,
Descobrisses que te gosto, e o quanto,
Sou apaixonado, vivo só para te querer.

Ah! Como eu gostaria tanto,
Que ao passares, me notasses.
Ou ao menos, por debaixo do manto,
Mesmo sem te aprazeres, me olhasses.

Um olhar teu, uma palavra, que emoção,
Um sorriso, para meu maior espanto,
Seria um alento, até mesmo por compaixão,
Ah! Como eu gostaria tanto.

R.S. Furtado. 

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Dor.

      

DOR

Bebe. O vinho do estilo te consola.
Para beber, não poupes sacrifícios,
que este tem, dentre todos os teus vícios,
a equivalência da melhor esmola.

Enquanto o pranto de teus olhos rola,
e em teu rosto se notam os indícios
dos mais negros e atroz malefícios,
teu coração, sobre o papel, imola.

Deu-te a Bruxa da Vida este destino.
Vens do Nada, e, no eterno torvelino,
ao mesmo Nada tornarás, em breve.

Vamos, Fantoche, Títere de argila,
sob o peso da dor, que te aniquila,
curva a cabeça, desgraçado, escreve.

Martins Fontes
 

Leia mais um belo soneto e um resumo da biografia do autor aqui:

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

A Iara.


A IARA

Vive dentro de mim, como num rio,
uma linda mulher, esquiva e rara,
num borbulhar de argênteos flocos, Iara
de cabeleira de ouro e corpo frio.

Entre as ninfeias a namoro e espio:
e ela, do espelho móbil da onda clara,
com os verdes olhos úmidos me encara,
e oferece-me o seio alvo e macio.

Precipito-me, no ímpeto de esposo,
na desesperação da glória suma,
para a estreitar, louco de orgulho e gozo...

Mas nos meus braços a ilusão se esfuma:
e a mãe-da-água, exalando um ai piedoso,
desfaz-se em mortas pérolas de espuma.

Olavo Bilac

Leia mais um belo soneto e um resumo da biografia do autor aqui:

sábado, 16 de agosto de 2014

Chôro de vagas.

   

CHÔRO DE VAGAS

Não é de águas apenas e de ventos,
no rude som, formada a voz do Oceano:
em seu clamor – ouço um clamor humano,
em seus lamentos – todos os lamentos.

São de náufragos mil estes acentos,
estes gemidos, esse aiar insano;
agarrados a um mastro, ou tábua, ou pano,
vejo-os varridos de tufões violentos;

vejo-os, na escuridão da noite, aflitos,
bracejando, ou já mortos e de bruços,
largados das marés, em ermas plagas...

Ah! Que são deles estes surdos gritos,
este rumor de preces e soluços
e o choro de saudade destas vagas!

Alberto de Oliveira 

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quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Mandatos.

 

MANDATOS

Fui benigno. E também leal com meus patrícios.
Não retirei o pão da boca de coitados.
Fechei-me às tentações e dei volta aos achados
Potes de ouro e dobrões que me seriam propícios.

Ao sonho consagrei, qual fogos de artifícios
Palavras com clarões que vos foram mostrados
E no potro do ideal corri nos descampados
A bandeira a agitar do Cristo os sacrifícios.

Só pequei por amor a celestes fascínios
De corpos aromais e sagrados escrínios
Onde depositei meus astros lapidados.

Ou Heliotrópios meus, adamantinos lácteos
Que o mistério maior, sem ter piedade abate-os
Na campina surreal dos fatos consumados.

Aureo Mello
 

AUREO MELLO (Aureo Macedo Bringel Viveiros de Mello) nasceu em Santo Antônio do Madeira, MT, em 1924, mas viveu boa parte de sua vida no Amazonas. Poeta, advogado, jornalista, pintor e político (ex-deputado e ex-senador).

Filho de Hugo Viveiros de Mello e Elvira Bringel de Mello. Casado com Maria Thereza Franco Ferreira de Mello.

Aposentou-se do serviço público em 1983, como Procurador e Consultor Jurídico do INCRA. Foi Deputado à Assembléia Constituinte do Estado do Amazonas, em 1947; Deputado Estadual, de 48 a 55; Deputado Federal pelo Estado do Amazonas, de 55 a 59 e pelo Estado da Guanabara, de... Leia mais aqui:

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Você se foi.



VOCÊ SE FOI

Você se foi, não disse adeus,
E nem sequer pensou nos sofrimentos meus.
Deixou-me assim na solidão,
Tão machucado está meu coração.

O nosso lar triste ficou,
Não tem mais vida, pois tudo acabou.
O meu viver, sentido já não tem,
Eu espero tanto, mas você não vem.

Mas se você quiser voltar,
A porta aberta você vai encontrar.
Com muito amor vou lhe esperar,
E muitos beijos prontos pra lhe dar.

R.S. Furtado.

sábado, 9 de agosto de 2014

Rio Araguaia.

 
RIO ARAGUAIA

Rio que rolas majestosamente,
Sobre diamantes, na itaipava hirsuta!
Não mais te abala, na selvagem luta,
Do bravo Ubirajara o grito horrente!

Não mais, à flor da lânguida corrente,
Por onde o boto espalma a cauda bruta,
Não mais o silvo do vapor se escuta,
Ondeando, além, na praia alvinitente!

Não mais! Não Mais! Silêncio... a tarde finda,
E as ondas beijam os destroços vagos
De velhas naus, numa elegia infinda...

Mas do teu fado nos castelos magos,
A Glória dorme, como dorme ainda
A pérola na concha dos teus lagos!

D. Aquino Correia 

Quarto ocupante da Cadeira 34, eleito em 9 de dezembro de 1926, na sucessão de Lauro Müller e recebido pelo Acadêmico Ataulfo de Paiva em 30 de novembro de 1927.


D. Aquino Correia (nome civil: Francisco A. C.), sacerdote, prelado, arcebispo de Cuiabá, poeta e orador sacro, nasceu em Cuiabá, MT, em 2 de abril de 1885, e faleceu em São Paulo, SP, em 22 de março de 1956.

Era filho do casal Antônio Tomás de Aquino e Maria de Aleluia Guadie-Ley Correia. Cedo revelou o amor aos estudos e... Leia mais aqui:


quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Ao luar.

   
 
AO LUAR

Os santos óleos, do alto, o luar derrama...
Eu, pecador, ao claro luar ungido,
Sonho: e sonhando rezo comovido
E arrebatado na divina chama.

Deus piedoso, consolo do oprimido,
Se compadece, à voz que ardente clama,
Porque meu coração, impura lama,
É um brado intenso para os céus erguido!

E o divino perdão desce da altura:
Grandes lírios alvíssimos florescem
Sob a lua, floresce a formosura...

E nessa florescência, imaculados
Raios londos do luar piedoso descem,
Choram comigo sobre os meus pecados.

Rodrigues de Abreu.


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terça-feira, 5 de agosto de 2014

Tortura.

   
 
TORTURA

A Adelino Fontoura

Ante a mesquita d’áureos minaretes
Açoitam dois telingas a traidora;
As vergastas, sutis como floretes,
Sibilam sobre a carne tentadora.

À vibração das varas, estremecem
Seus níveos membros firmes, delicados,
E, nos espasmos do sofrer, parecem
Das contorções do gozo eletrizados.

Geme aos golpes, que as carnes lhe retalham,
E aberta a rósea boca, os olhos belos
Pérolas vertem, que seu peito orvalham;

Dobram-se as curvas, soltam-se os cabelos,
E do alvo colo, amargurado e exangue,
- Como esparsos rubis - goteja o sangue.

Valentim Magalhães
 


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